Um olhar sobre a Audiência Pública em Homenagem ao PRECE
E andavam para o sul, metidos naquele sonho. Uma cidade grande, cheia de pessoas fortes. Os meninos em escolas, aprendendo coisas difíceis e necessárias. Chegariam a uma terra desconhecida e civilizada, ficariam presos nela. E o sertão continuaria a mandar gente para lá. O sertão mandaria para a cidade grande homens fortes, brutos, como Fabiano, sinhá Vitória e os dois meninos.
(Graciliano Ramos – Vidas Secas – fragmento)
Caro leitor, inicio este texto dialogando com Graciliano Ramos, autor de uma das obras mais emblemáticas da literatura brasileira e, em particular, do regionalismo. Em Vidas Secas (fragmento em epígrafe), o autor consegue dramatizar o sofrimento de uma família e, em particular, uma cachorra, mas não qualquer cachorra, é Baleia. Retirantes, flagelados, famintos, esses personagens caminham como diz o texto, “metidos naquele sonho”, rumo à redenção de suas mazelas. Nesse contexto, a escola aparece como um dos sonhos dos retirantes, em especial, os dos pais, Sinhá vitória e Fabiano: “Os meninos em escolas, aprendendo coisas difíceis e necessárias.”,
Os escritores da famosa Geração de 30 caracterizavam-se por adotarem visão crítica das relações sociais, apresentando o homem massacrado pelo ambiente, pela terra, a cidade, o homem devorado pelos problemas que o contexto social lhe impõe.
E por falar em contexto, a audiência pública em homenagem ao PRECE marca um novo momento na nossa história. Talvez você se questione qual a relação da audiência com Vidas Secas, lhe peço calma; porque lhe explicarei logo mais.
Não reconhecer as dimensões que o PRECE ganhou, nas palavras vivas e saltitantes de Tony Werison, é “miopia intelectual”. Essa foi uma das frases marcantes nas falas dos oradores precistas, terça, dia 16/06/09, nos auditórios 01 e 03 da Assembléia Legislativa do estado do Ceará.
Os auditórios estavam repletos de políticos, membros da imprensa, pais, professores, autoridades diversas e cidadãos das diversas cidades onde o PRECE atua e, principalmente, de Pentecoste. De uma pequena célula de 07 estudantes, a mais de 350 universitários, da rejeição da classe política local ao reconhecimento internacional (a CEPAL é uma excelente referência para isso), das rudimentares estruturas da casa de farinha à universidade, dos estudos em torno de lamparinas a uma Audiência Pública na Assembléia.
Semelhante à obra de Graciliano, dramatizamos, no palco da vida, nossas mazelas, dores, inquietações. Pode até parecer exagero a comparação com a obra, mas um olhar mais apurado nos permite observarmos as semelhanças. As fracas condições de nossa cidade nos obrigaram a seguir rumo à cidade grande, a escola de qualidade surge como um de nossos principais sonhos, de nossas famílias. Um diferencial é que temos a perspectiva do retorno e esse retorno acontece ainda durante o processo, semanalmente. Vários projetos são desenvolvidos, em diferentes áreas de atuação, nas comunidades mais longínquas do nosso município. Assim, temos a oportunidade de contribuirmos para a transformação da nossa realidade.
Assim, amigo leitor, seguimos degustando diferentes pedaços de sonhos. Retomando o texto em epígrafe, destacamos que no romance de Graciliano, Baleia sonha. Moribunda, não entendendo porque será sacrificada ela sonha, sonha com um céu cheio de preás gordinhos. O autor faz questão de humanizar o animal, e destacá-lo com um dos personagens que melhor conseguem expressar seus anseios.
Quando falo de sonho, pode parecer lugar comum, clichê, mas lembro que tive a oportunidade de coordenar uma escola de educação infantil em Pentecoste. Nesse período, uma das imagens mais marcantes era a dos pais deixando os filhos na escola. Eles entregavam as crianças e ficavam estáticos, parados, vendo o filho entrar, sentar. Os olhos daqueles pais brilhavam ao deixar a criança na escola. “Os meninos em escolas, aprendendo coisas difíceis e necessárias.” Oportunidades que muitos deles não tiveram, agora os filhos teriam. E, é nessa esperança que pensamos no desenvolvimento social de nossas comunidades, acreditando que a escola é o caminho mais democrático para isso. Uma escola pública e de qualidade para nossa gente. Que esses sonhos não possam ser podados. Que o PRECE possa continuar contribuindo para a realização desses sonhos. Vida longa ao PRECE!
Por Nonato Furtado
Fonte:http://nonatofurtado.blogspot.com/
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